sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Eles querem a Monarquia

Nas marchas da cidade de Viseu. O presidente da Câmara Fernando Ruas, D. Duarte de Bragança, Paulo Teixeira Pinto e Mónica Félix
Nas marchas da cidade de Viseu. O presidente da Câmara Fernando Ruas, D. Duarte de Bragança, Paulo Teixeira Pinto e Mónica Félix
Acreditam em histórias de príncipes e princesas, sonham com palácios ou títulos nobiliárquicos e usam anel com brasão no dedo mindinho. Defendem a pátria, mas encontram na figura do rei um ser superior a quem desejam delegar e aos seus descendentes o poder. Os monárquicos em Portugal padecem de um defeito. Os estereótipos. Desse cliché faz parte a ideia de que são na sua maioria velhos, enquanto os mais novos são uns betinhos conservadores. Também se lhes atribuem características estéticas, como usarem bigodes enroladinhos e botões dourados. No fundo são uns marialvas, fidalgos, que gostam de fado e de touradas. "Esta tem sido, aliás, a grande obra dos republicanos portugueses ao diminuírem os monárquicos a um conjunto de estereótipos", esclarece Mendo Castro Henriques, professor universitário, e presidente do Instituto da Democracia Portuguesa, um organismo de reflexão que é assumidamente simpatizante de uma monarquia democrática.
Mas as ideias feitas são até certo ponto verdades. Frequentam quase todos os mesmos sítios, como os exclusivíssimos Turf ou Tauromáquico, clubes privados de homens, onde só se entra por convite; o clube Pé-Leve, centrado por uma mesa comum, enorme, onde se encontram para almoçar em 'família' ou o Círculo Eça de Queiroz. No Porto, escolhem o Clube Portuense e, na Madeira, o Clube Micaelense, no Funchal. Os católicos lisboetas frequentam a missa das 10 horas de domingo na Igreja de Santa Isabel ou em Santos. Gostam de equitação, são sócios do Centro Hípico do Campo Grande, em Lisboa, e têm os filhos no râguebi, na vela ou no polo. Mas, surpresa das surpresas, também há o oposto, ou seja, gente humilde ou da classe média simpatizantes do regime monárquico, sem títulos, nem honrarias. Homens e mulheres, com diferentes opções sexuais, políticas, da esquerda e da direita. Os simpatizantes do regresso da monarquia dizem-nos que cabem todos, desde os operários a donos de grandes empresas. "Há até filiados do partido comunista que me dizem que mais do que simpatizantes do regime monárquico se assumem como monárquicos", esclarece desde logo D. Duarte de Bragança, adepto das viagens pelo interior do país, sobretudo se for de comboio, e visita frequente, por convite, das feiras, festas e romarias que se fazem de norte a sul.

Vidas reais


Paulo Teixeira Pinto
Paulo Teixeira Pinto
A família que representa oficialmente a Casa Real Portuguesa vive rodeada de uma corte onde pontuam nobres com títulos sonantes, mas também professores universitários, economistas, advogados e juristas, membros jovens e menos jovens de família antigas que gostam de aparecer e fazer a vénia aos seus membros. E ainda há gente que se junta ao movimento monárquico por prestígio e tentativa de ascensão social.
D. Duarte é talvez o mais tímido dos elementos da Casa de Bragança. Quando é preciso quebrar o gelo ou pôr as coisas em movimento lá está Dona Isabel. Sempre pronta a dançar com um elemento de um rancho folclórico. A escolha de Dona Isabel de Herédia para sua mulher, atual duquesa de Bragança, foi consensual entre o meio monárquico, mas não foi unânime. Descende do visconde da Ribeira Brava, um conhecido apoiante da Carbonária e da revolução republicana. Quinze anos depois o casamento dos duques, que foi transmitido em direto pela televisão, e que teve honras de Estado, parece sólido como uma rocha. Em situações públicas ou em momentos mais privados, não é raro vê-los de mãos dadas ou até a trocarem, discretamente, um afago. É à matriarca que tem cabido em grande parte a educação dos três filhos: Afonso, com 14 anos, que ingressou no início de setembro num colégio interno inglês; Maria Francisca e Dinis que estudam no elitista Colégio São João de Brito, em Lisboa. O filho primogénito tem uma grande paixão pelos assuntos ligados ao mar e à ecologia e a sua adaptação ao ensino britânico "está a correr bem e já tem alguns amigos", diz-nos a mãe. Confessa-nos também que lhe está a custar este afastamento, mas reconhece que é para o bem do seu filho. "Precisa de abrir horizontes, afastar-se um pouco deste meio e ter contacto com outras realidades. Vai ser uma experiência fantástica para o seu futuro." E acrescenta: "Claro que tem saudades da família, dos amigos e do colégio onde estava." E do seu animal de estimação, um camaleão que deixou entregue aos irmãos mais novos e que têm como incumbência alimentá-lo com os grilos e gafanhotos que apanham nos jardins da casa que a família tem em Sintra.
D. Duarte de Bragança diz da educação do seu filho: "Tentamos que seja um homem coerente, que tenha amor a Portugal e que tenha um sentido de missão, uma obrigação especial por pertencer a esta família. Por definição, as suas responsabilidades e as dos irmãos serão maiores do que dos restantes portugueses." O mesmo pensou o seu primo Francisco van Uden, na linha de sucessão caso o duque de Bragança e os seus dois irmãos não tivessem descendentes. "Houve um dia em que me questionei sobre se teria ou não responsabilidades de educar o meu filho mais velho, Afonso que nessa altura tinha 15 anos, para a eventualidade de suceder ao trono. Era preciso que estivesse preparado a tempo e horas para essas funções. Para não ser acusado - se isso acontecesse - de ter sido ingénuo ou displicente na sua educação. Por isso, Francisco van Uden falou com o primo. "Graças a Deus, ele arranjou uma noiva magnífica, casou e tem três filhos. Eu suspirei de alívio, recuperei total liberdade e julgo que o meu filho também." Francisco van Uden diz que "uma das vantagens da monarquia é que não se é chefe de Estado por acidente, ou por uma campanha eleitoral ter corrido muito bem, essa função é conhecida desde pequenino e as crianças são preparadas para tal". Um peso nas costas de alguém que não escolheu nascer pretendente? Duarte de Bragança responde: "Os meus filhos, tal como eu e os meus antecessores, cresceram assim, nesse ambiente, com certas regras e certas exigências. Sabem o que se espera deles. Apesar de ainda serem muito jovens, já vão a alguns eventos oficiais, sobretudo o mais velho, o príncipe da Beira."
A causa dos monárquicos em Portugal está mais ativa do que nunca. Sucedem-se os encontros, os debates, as palestras nas escolas, as discussões nas redes sociais e aumentam todos os meses o número de pessoas que se querem filiar na Causa Real, um movimento político que luta pela instauração da monarquia. "Uma monarquia democrática, constitucional, liberal e moderna", defende o seu presidente, Paulo Teixeira Pinto.

Monárquicos em festa


Ao longo do ano as atividades com maior visibilidade pública são a Festa Azul e Branca, que ocorre anualmente no dia 4 de outubro, e que no ano passado incluiu um passeio e festa a bordo de um cacilheiro do Tejo, seguida de uma arruada desde o Cais do Sodré até à Praça Luís de Camões, no Chiado, onde se situa a sede da Causa Real. Ou, ainda mais importante, o jantar dos Conjurados, que se realiza no dia 30 de novembro, no Convento do Beato, e que reúne mais de mil pessoas. "Trata-se de uma manifestação de fidelidade à família real portuguesa, em memória da reunião dos Conjurados de 1640, quando se restaurou a independência portuguesa", explica João Matos e Silva, presidente da Real Associação de Lisboa.
Uma iniciativa que muito agrada a D. Duarte de Bragança, o pretendente ao trono, para quem "o rei é o símbolo da nação, a figura que permite maior estabilidade da vida política. É um árbitro, independente, nem de esquerda nem de direita, e por isso poderia evitar o frequente conflito político a que Portugal está habituado. Como é que se aceita que o supremo árbitro da vida política pertença a um dos clubes que está em jogo?" Na Real Associação do Porto, diz-nos o seu presidente Jorge Leão, "temos um pedido de inscrição por dia". Porquê? D. Duarte de Bragança explica: "Na nossa república o povo é tratado como ignorante. A nossa democracia limita o direito de escolha ao não permitir que se pronuncie sobre o tipo de chefia de Estado que queremos. É este um dos limites materiais da nossa Constituição." Paulo Teixeira Pinto vai mais longe e diz que ao defenderem um regime monárquico constitucional estão a defender o futuro, daí o crescente interesse. "A monarquia não é um programa político, não é uma ideologia, não se antepõe a nenhum dos outros partidos. Pelo contrário. O que se pretende é uma monarquia diferente da de 1910, democrática, constitucional, mais moderna."
Em Lisboa são "os jovens quem mais se entusiasma com o movimento", explica Duarte Calado, o presidente da Juventude Monárquica, que recentemente inaugurou a sua sede no Bairro de São José. Distribuem bandeiras azuis e brancas nas praias, nas escolas, nos sítios por onde passa D. Duarte, como fizeram nas festas da cidade de Viseu, onde a população aplaudia as marchas populares e entoava quadras republicanas acenando a bandeira monárquica. Também aí o duque de Bragança mostrou o seu fair-play, enquanto assistia na tribuna de honra com as autoridades locais e ladeado pelo presidente da Câmara, Fernando Ruas. Daí via o desfile, enquanto trauteava alguns versos, recebia doces e flores das marchantes vestidas de República enquanto era cumprimentado em segundo ou terceiro alugar, logo depois de Ruas e da mulher do presidente da Câmara. Aguentou estoicamente até ao final.
Por todo o país são mais de dez mil os filiados no movimento oficial monárquico, a Causa Real, mas "há claramente grupos informais monárquicos organizados, alguns deles que usam as redes sociais, encontros e convívios para falarem e divulgarem as vantagens de um regime monárquico. Dentre desses grupos destaca-se o 31 da Armada, o projeto Democracia Real ou a Plataforma Centenário da República", esclarece Mendo Castro Henriques, enquanto avisa: "Não se estrague as comemorações da República, mas a partir do próximo ano as nossas forças e as nossas ações serão mais visíveis." E dá um exemplo: "Em 2011 vai ser publicado um livro chamado '100 Anos sem Rei', que tem colaborações de todos os quadrantes da sociedade portuguesa."

Sem partido político


Paulo Teixeira Pinto recusa a ideia de um partido monárquico. "Porque o rei está acima de todas as partes e não representa parte alguma. Os monárquicos devem fazer exercício político nos diversos partidos políticos, não como partido político ao mesmo tempo. Ser monárquico não é algo distintivo de ser social democrático, socialista, conservador ou liberal." Diz que o movimento que lidera nunca fará desafios à ordem pública, "porque acima de tudo respeitamos um estado de direito e a República, porque é um estado de direito". Por isso, acrescenta: "Não fazemos manifestações subversivas ou contestações."
Mas como é que o presidente da Causa Real olha para as ações mais subversivas, como a substituição da bandeira republicana pela monárquica, como já aconteceu na Câmara de Lisboa, no Parque Eduardo VII ou em Guimarães? Teixeira Pinto responde: "São ações próprias que a Causa Real enquanto tal não poderia promover. Mas noto a irreverência e o espírito de uma juventude irrequieta. Isso parece-me positivo." Rodrigo Moita de Deus é um dos cabecilhas dessas ações. "Ao colocarmos a bandeira azul e branca na varanda dos Paços do Concelho de Lisboa, dessacralizamos um espaço. Era esse o objetivo da ação. Fizemos o mesmo no Parque Eduardo VII, o que já incluiu uma grua, um guindaste e já deu muito mais trabalho", ironiza. O grupo de jovens mentor destas iniciativas divulga-as através do Facebook e do Youtube. Escolheram como nome Carbonara. "Inspirámo-nos na Carbonária, somos um grupo de operações especiais monárquicos, espalhados de norte a sul do país." O que têm preparado para este 5 de outubro?, perguntamos-lhe. A resposta merece respeito: "Se tudo correr bem, esperamos estar presos." E mais não dizem

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